"Coloque mais sentimento no espancamento! Se você quer fazer alguém sentir dor, você tem que fazer isso com paixão!"
É complicado escolher apenas uma citação para iniciar uma texto sobre Ichi, o Assassino, de Takashi Miike. Existem dezenas de frases geniais no filme, todas com o senso de humor doentio característico da obra do demente japonês. Aliás, não apenas as frases, mas todo o filme está rondado de humor. Vezes ácido e vezes idiota; vezes sádico e vezes masoquista. Ácido, idiota, sádico e masoquista, essas são as palavras corretas para descrever Ichi, o Assassino, seu protagonista Kakihara e de certa forma, toda a obra de Miike.
Ichi, o Assassino (Koroshiya 1, do original japonês) fala sobre um chefe da Yakuza apelidado de Boss Angel, que foge com uma grande quantia em dinheiro, fazendo com que Kakihara e sua gangue passe a persegui-lo. Os métodos chocantes de tortura de Kakihara chamam a atenção de gangues rivais. Tudo piora quando Kakihara contrata Ichi, um brutal psicopata depressivo.
O enredo básico apesar de ser batido e até meio clichê, é conduzido de maneira insana pelo roteiro de Sakichi Satô e Hideo Yamamoto. As doses cavalares de violência apresentadas na tela chegam a ser hiperbólicas (a exemplo da cena do estupro, seguido de espancamento, seguido de mutilação, seguida de empalamento), e as personagens tão exagerados quanto a violência. As características delas são dignas de seriados do Adult Swim: Kakihara é um torturador masoquista e gay; Ichi é um assassino depressivo e doente mental criado e controlado por hipnose; Jirô e Saburô são dois mercenários gêmeos que se comunicam por telepatia; Jijii controla Ichi e é viciado em comida; Karen também é controlada por Jijii e faz um treinamento com Kakihara (em uma das brilhantes cenas protagonizadas pelos dois que ouvimos a frase que abre esse texto). Sem contar a prostituta que agride verbalmente Ichi por salvá-la de um estupro (sendo assassinada logo depois, em um ato desesperado do pobre assassino). Todos os clichês de uma trama supostamente batida são quebrados aqui, e quando não são quebrados, são mostrados de maneira tão extrema que passam a ser originais.
Mesmo com a originalidade do roteiro, o que realmente chama a atenção para o filme é a genialidade retardada de Takashi Miike, que apresenta aqui um de seus trabalhos mais bizarros. Cortes abruptos, câmeras rápidas sendo alternadas com câmeras lentas, closes e o gore mostrado sem nenhum escrúpulo podem ser comparados com Morrer ou Viver e Sukiyaki Western Django, ambos do mesmo diretor.
A batalha final entre Ichi e , Kakihara é muito bem construída por Miike, de maneira alinear e fantasiosa, com entradas na mente de Kakihara e várias mortes seguidas de ambos os personagens, além da decapitação de um pequeno garoto que se dispôs durante o filme inteiro a ser o único amigo de Ichi, provando que Miike é um diretor sem limites morais ou éticos.
Ichi, o Assassino é um filme recomendado para todos os fãs do bom cinema asiático. Não o dos fantasmas com cabelo grande e molhado, mas sim o cinema contundente e ácido de Chan-wook Park, Shion Sono, Fruit Chan, Nobuo Nakagawa e, sem dúvidas, Takashi Miike. Afinal, ser um ídolo do "rei do mimimi" Quentin Tarantino não é para qualquer um.
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